Manuel Sobrinho Simões
"É mau ter-se perdido o hábito
das contas à moda do Porto"
O desafio era convencer Sobrinho Simões, 59 anos, a despender tempo com um pingue-pongue pouco académico. Mas o investigador do IPATIMUP – dos maiores do mundo em cancro – aceitou-o com a generosidade habitual. E com rigor científico: seis dias depois, como prometeu, eis as respostas , com direito a bónus: uma pergunta para Rui Rio.
[Entrevista de Helena Teixeira da Silva publicada a 26 de Julho na série farpas do Jornal de Notícias]
Tendo um conflito com o correio electrónico, porque razão optou por responder-me por mail?
Não gosto de entrevistas telefónicas – não se vê a cara do outro e não se tem tempo suficiente para pensar – e tive medo que não percebesse a minha letra se lhe mandasse um fax.
E há a voragem do tempo, obsessão sua. Não consegue mesmo retirar prazer de coisas inúteis, que aparentemente não acrescentem nada e se esgotem no momento em que acontecem?
Gosto muito mais de pessoas do que de coisas. E das coisas, gosto sobretudo das que duram: livros, casas, pratos de louça, bicicletas, discos. (Não gosto de roupa nova, prefiro cinema ao teatro...)
A sua paixão pelo cinema inclui os filmes de cineastas portugueses?
Sou um apreciador de alguns Oliveiras (mais dos primeiros) e da maioria dos filmes de João César Monteiro e de Fonseca e Costa.
Numa família de médicos, é possível conversar sobre banalidades à hora da refeição?
Claro. Desde o tempo dos meus bisavós (também médicos) que as refeições familiares são momentos extraordinários de conversa, cacarejo e ternura que pouco têm a ver com a medicina.
Leva trabalho para casa?
Sempre, demasiado, numa pasta que me acompanha para toda a parte, despertando uma enorme irritação doméstica.
No Porto, as pessoas da sua geração falam sempre da existência de uma "tribo" à qual pertencem. Às vezes, parece só um grupo de pessoas, cujo denominador comum é o estrato social. É mais do que isto?
É mais do que isso: sentido de pertença, cumplicidade, falta de mobilidade social, alguma homogeneidade profissional, ética republicana, primado da acção sobre o discurso, ironia e humor q.b., boas contas, …[Aviso à navegação: Portugal está a dar cabo das profissões e isso é péssimo; também é mau ter-se perdido, generalizadamente, o hábito das contas à moda do Porto]
Consegue fazer um diagnóstico breve da cidade?
Um diagnóstico morfológico do Porto de que gosto muito, com certeza: cidade marítima, granítica, cinzenta, enevoada, sólida, segura. Como na medicina, o problema está mais no prognóstico do que no diagnóstico, mas esse não depende da cidade, depende de todos nós.
Tem em comum com o arquitecto Eduardo Souto Moura o "Prémio Pessoa". Também partilha o gosto pela Av. Dos Aliados?
A Avenida dos Aliados merecia ser melhor aproveitada. Valha a verdade que o não tem sido mais por culpa dos comerciantes e das gentes do Porto do que dos suspeitos-do-costume.
Posso perguntar-lhe onde investiu os cerca de 40 mil euros do prémio?
Fosse qual fosse a quantia – já não me lembro do valor exacto – sei que foi para o bolo comum da economia familiar.
Eduardo Barroso escreveu, uma vez, que num país que investe tão pouco na ciência, infelizmente, ninguém lhe pede (como a Mourinho) para fazer anúncios para a American Express ou para o BPI. Se lhe pedissem, era capaz de o fazer?
Não.
De quanto tempo precisa para se sentir realmente em férias?
Costumo sentir-me desligado do trabalho algures durante a terceira semana – cheguei até a ter uma teoria que apontava para um clique no décimo oitavo dia de férias. Agora só faço mesmo três semanas.
Já lhe aconteceu, em Moledo, cruzar-se com Durão Barroso, onde ambos possuem casa. Falam de política, do estado do país ou cingem-se à cordialidade do cumprimento?
Não me lembro de ter conversado alguma vez com o Doutor Durão Barroso em Moledo.
Nas imensas viagens de trabalho que faz, tem a curiosidade de vasculhar a cidade onde dorme?
Sempre que posso, faço-o e faço-o a pé: cafés, livrarias, mercados, pontos altos, beira-mar, beira-rio... Infelizmente quase nunca tenho tempo.
Não exercendo prática clínica, acontece-lhe receber telefonemas de doentes que esperam de si uma solução?
Mais cartas e e-mails do que telefonemas (Protejo-me ao máximo das abordagens telefónicas). Mesmo sem ser capaz de resolver os problemas – nunca fiz clínica – sinto-me na obrigação de procurar ajudar, respondendo o melhor que sei. Não há pior para quem está doente do que a solidão e o desamparo.
Quando está doente, sente-se mais confortável a ser tratado por especialistas homens ou mulheres?
Procuro escolher os meus médicos pela competência, não pelo sexo. Começaram por ser antigos professores, depois colegas de curso e agora já são muitas vezes antigos alunos. É mais difícil lidar com a diferença de idade do que com a diferença de sexo (Lembro-me da surpresa que senti, há muitos anos, quando percebi que os policias de trânsito e os jogadores de futebol já eram mais novos do que eu.)
Tem algum vício que potencie qualquer tipo de doença?
O sedentarismo é o pior.
Explique-me, por favor, o cancro da tiróide como se eu tivesse cinco anos.
Não consigo explicar o que é um cancro a uma criança pequena (Nem sequer o que é a tiróide).
Se, por hipótese absurda, lhe dissessem que as temáticas que estuda atingiram um ponto em que não é possível acrescentar-lhe mais conhecimento, ainda assim, continuaria a investigar?
Penso que essa hipótese apenas se poderia pôr por limitações logísticas. A investigação apenas nos permite a aproximação ao que pensamos ser a verdade e é, por isso, virtualmente inesgotável.
Se fosse, por qualquer razão, igualmente absurda, fosse obrigado a prescindir de uma das suas actividades, qual seria?
Abandonaria a investigação científica e conservaria o ensino e a medicina diagnóstica, naturalmente empobrecidos pela falta de investigação.
Sei que vê o Dr. House. É mais parecido com ele na eficiência dos diagnósticos ou no mau feitio?
Acho que nem uma coisa nem outra, mas não tenho a certeza quanto ao mau feitio. Aprecio sobretudo no Dr. House a inteligência operacional que o leva a fazer as perguntas certas. Saber perguntar é muito mais difícil do que saber responder, por mais que a cultura portuguesa nos empurre no sentido contrário.
Philip Roth, um dos seus escritores preferidos, escreveu que "A grande partida biológica que nos pregam é que nos tornamos íntimos antes de sabermos alguma coisa acerca da outra pessoa". Faz sentido?
Estou em desacordo com uma primeira leitura, a puxar para o primário, da afirmação de Roth – a intimidade é consciente e afectiva, não é biológica. Elaborando um pouco mais, a afirmação faz todo o sentido, sobretudo se pensarmos o fim da frase no plural (as “outras pessoas”, que somos). Não é por acaso que co-organizei, na Porto 2001, o Programa “Os outros em eu”.
Já disse, várias vezes, que em Portugal ninguém parece ter capacidade para fazer perguntas. Que pergunta lançaria a Rui Rio?
Não me recordo de ter dito isso de forma tão abrutalhada mas, se calhar, disse. As perguntas-chave a Rui Rio andariam à volta do seguinte: O que fazer para aproximar o Porto de Barcelona?
Marcadores: Farpas, Manuel Sobrinho Simões
2 Comments:
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